PRINCÍPIOS PARA UMA ADORAÇÃO BÍBLICA
Texto extraido do artigo "As influências do culto do Antigo Testamento na liturgia" de Gerard Van Groningen*.
1.
Adoração.
O
culto deve ser centralizado em Deus. Isso não foi mudado no Novo Testamento. A
adoração deve ser prestada a Deus, Ele reivindica e espera isso de Seu povo.
Cultuar, portanto, é um ato de obediência, é trabalhar para Deus, é serviço.
Essa é a razão pela qual podemos falar do serviço de culto, e não da reunião de
culto; a menos que você esteja enfatizando o encontro do povo com Deus. Adorar
a Deus por causa de Deus significa que honramos o Seu caráter. Ele é
espiritual, e por isso Jesus disse que devemos adorá-Lo em espírito. Também por
isso a ordem para não fazer ídolos ou qualquer representação física de Deus.
Isaías ficou impressionado quando estava no templo e viu a Deus, pois Deus é
Santo, separado do que é material, puro; e, como espiritual que é, Ele não está
limitado a experiências humanas. As experiências não podem determinar ou
governar o tipo de liturgia. Se limitarmos o culto às nossas idéias, estaremos
limitando o Deus infinito. Na medida em que viajo por diferentes países do
mundo, tenho sofrido pela falta do entendimento do que é a santidade de Deus, e
pela falta do verdadeiro culto a Ele. Querem trazer Deus ao nível deles, ao invés
de elevarem-se ao nível santo de Deus. Deus não é apenas santo, Ele é também
majestoso. Os Salmo 93 diz que Ele está revestido de majestade, Deus é
glorioso, é sublime, é lindo. Devemos adorá-Lo no Seu esplendor e na Sua
beleza. Se mantivermos a nossa adoração nesse contexto próprio de beleza,
majestade, e sublimidade, adoraremos a Deus da forma como Ele deve ser adorado.
O
Deus do Antigo e do Novo Testamento é um Deus de amor, bondade, compaixão, e
misericórdia. Mas esse Deus compassivo e misericordioso é, ao mesmo tempo, o
Governador, o Soberano de todas as coisas. Todos os povos digam: Deus reina!
Mas os pregadores, os sacerdotes, devem dizer isso primeiro, conforme Isaías.
Na presença do Rei, no Palácio do Rei, os súditos nada são e devem portar-se
com humildade e com disposição para servi-Lo. Vocês podem imaginar as pessoas
indo ao palácio batendo palma "- Por que você está batendo palma?"
"-porque eu gosto." Não, na presença do Altíssimo a nossa atitude não
deve ser baseada naquilo que gostamos, mas sim naquilo que Ele requer que
façamos. Afinal, quem está sendo cultuado, você ou Deus? Sinto muito se vocês
gostam de bater palmas, isso é tão vulgar, diminui a beleza, e o esplendor da
glória de Deus. Se o culto é centralizado em Deus, não apenas devemos honrar o
caráter de Deus, devemos honrar também a vontade de Deus. Deus tem falado, e
nada deve tomar o lugar da Palavra de Deus que está prescrita para nossa
adoração. Eu quero repetir: Deus estabeleceu o tempo e o modo do culto, e isso
é uma questão de obediência. É da vontade dEle que confessemos os nossos
pecados e que compareçamos à Sua presença com um coração quebrantado, os
sacrifícios do Antigo Testamento falam disso. Ele nos conclama a relembrar o
que éramos e o que hoje somos como pessoas redimidas.
2.
A postura do povo na adoração.
Somos
portadores da imagem de Deus, e Ele não se esquece disso. Podemos pensar,
sentir, falar e cantar; somos mais do que seres materiais físicos, somos
espirituais; e é no culto que ocorre o encontro do nosso ser espiritual e Deus.
3.
O líder.
No
Antigo Testamento o culto devia ser conduzido diretamente por líderes indicados
para esse fim (senão leiam de Êxodo 25 a Levítico 10; e Oséias). Os sacerdotes
são condenados por não dirigir o povo, e ainda por serem dirigidos pelo povo. O
povo de Deus no Antigo Testamento sempre precisou de líderes, o sacerdote tinha
que conduzir o povo naqueles festivais, na expiação; então havia o
sumo-sacerdote, o sacerdote, e os levitas, cada um com tarefas determinadas, de
acordo com a administração superior do sumo-sacerdote. O Antigo Testamento
mostra a necessidade da liderança, e estes sacerdotes tinham que se apresentar,
conforme era prescrito, com roupas puras e brancas. Se os seus mantos tivessem
uma mancha, eles estariam desqualificados para dirigir o povo no culto. Eles
tinham que ter os adornos perfeitos. Deviam ser totalmente consagrados, receber
um sangue purificador nas pontas dos dedos das mãos e dos pés, e seguir as
prescrições de como o culto deveria ser conduzido. Aliás, só havia um modo de
conduzir um culto aceitável, o modo prescrito por Deus. Só assim Ele aceitava
os sacrifícios do povo através dos sacerdotes. Eles tinham até mesmo que tomar
cuidado quanto ao modo como subiam os degraus das escadas que conduziam ao
altar, as suas roupas teriam que ser de tal forma que cobrissem todo o seu
corpo em todo o tempo. Estou mencionando esses detalhes porque eles estão lá.
Na preparação para o culto, eles tinham que privar-se de contaminação com
corpos, com cadáveres, com pessoas doentes e de qualquer relacionamento íntimo
com a esposa. Em Levíticos, lemos que quando não houvesse uma obediência
estrita a essas prescrições eles seriam mortos. Todos os líderes nesta posição
deviam se conscientizar desse caráter mediatório da sua função, eles
representavam a Deus perante o povo, eles tinham estado na presença de Deus,
eles tinham que refletir a santidade, a majestade, e a beleza de Deus; mas eles
também compareciam lá representando o povo, eles falavam a Deus em favor do
povo. Deus era o Rei; o povo, os servos; e os sacerdotes, os mediadores. Mas
não eram mediadores como reis, e sim como alguém do povo que apontado por Deus
para representar o povo perante Ele. Eles tinham que elevar o povo até o padrão
de Deus, e não trazer Deus aos padrões do povo. Essa era a prescrição do Antigo
Testamento.
Às
vezes ouço dizer que não estamos na era do Antigo Testamento. Contudo, também
no Novo Testamento podemos ler a respeito de pessoas que foram indicadas para
liderar, e foram qualificadas por Deus para esse trabalho. O papel do líder não
foi renegado no Novo Testamento.
4.
A adoração deve expressar a relação pactual estabelecida por Deus entre Ele e o
Seu povo.
Ele
é o Senhor Soberano cujo amor tem sido demonstrado em atos e palavras. Mas Ele
é o Senhor e nós, os servos. Nessa relação, devemos nos tornar a cada dia mais
semelhantes a Ele. Eu ouço dizer que, no casamento perfeito, a esposa se torna
mais e mais semelhante ao marido, mas isso é um pouco bilateral, porque o
marido também deve aprender com a esposa. Agora, o que me conforta é que Deus
não Se torna semelhante a nós, mas Ele nos compreende, e quando não fazemos
exatamente o que Ele quer, Ele ainda é compassivo e continua a perguntar:
"você me ama?" Todos os que O amam fazem a Sua vontade.
5.
O quinto princípio da adoração é que há um julgamento pelo pecado e, por isso,
o sacrifício deve ser representado.
O
pecado tem que ser coberto, a expiação, a propiciação, foi feita por Cristo, em
nosso favor. Os sacrifícios do Antigo Testamento apontavam para aquilo que
Cristo iria fazer. No Antigo Testamento não havia culto, e nem adoração, sem
sacrifícios; não havia culto sem altar. Para nós, não há culto sem o
significado da cruz, não há culto sem Jesus Cristo, que foi imolado e agora
reina. Israel tinha que repetidamente ouvir as maldições do pacto sobre aqueles
que o violavam; ouvia as bênçãos, mas tinha que ouvir as maldições também, para
lembrar-se de que havia um caminho da vida mas que havia também um caminho da
morte.
Além
disso, a adoração devia também incluir ofertas, e os sacrifícios deviam
expressar gratidão, devoção, desejo de comunhão e meditação, prontidão, e
voluntariedade para compartilhar coisas materiais com os sacerdotes, levitas,
os pobres, e as viúvas. Não havia lugar para a mesquinhez no culto.
No
Sinai, Deus trouxe o povo a um lugar; no Tabernáculo, Ele trouxe o povo para Si
mesmo; no Templo , Ele atraiu o povo para Si, em um lugar; porque num lugar
centralizado, a imortalidade de Deus e a Sua permanência eram expressas de uma
maneira mais bela; porque num lugar centralizado a Sua beleza, Sua glória,
poderia ser também melhor expressa; mas de uma maneira ainda mais
significativa, o lugar centralizado era onde a unidade de Israel, como um só
povo, podia ser melhor expressa. Eu devia ter mencionado isto antes mas vou
mencionar aqui: No lugar centralizado, aquilo que Deus tem feito deve encontrar
também a sua melhor expressão. Como um só povo, reunido num só lugar, devemos
reconhecer a Deus como aquele que nos criou e que nos redimiu. Lembrem-se, as
festas foram colocadas para lembrar as maravilhas que Deus tinha feito
(Deuteronômio 5). A festa do Tabernáculo expressava o modo como eles viveram no
deserto e como Deus os conduziu lá; a festa das colheitas era a maneira como
eles celebravam as boas coisas que Deus lhes concedia. Portanto, a adoração é
uma expressão concreta do reconhecimento de que Deus é um Deus generoso,
criador e redentor. No Novo Testamento, isso se traduz em louvores a Deus por
nos dar o Seu Filho. Lembramos da morte e ressurreição de Jesus Cristo, do Seu
Reino, e do Seu Espírito derramado sobre nós. Assim, também devemos dar ações
de graças a Ele através das nossas dádivas.
6.
O último princípio de que vou tratar é que o culto é para toda a família.
Pais,
como chefes do lar, representando o rei; mães, como as rainhas, tão reais
quanto o pai; e os filhos, que são os príncipes e as princesas; todos tiveram
que estar lá no culto a Deus, no Sinai. Quando Deus fez um pacto com o Seu
povo, eles todos tiveram que estar presentes, até mesmo as crianças de peito; e
não havia um culto especial para as crianças lá (estou pisando em terreno
perigoso?) Talvez possamos falar um pouco sobre isso. No Antigo Testamento, as
crianças tinham que ser trazidas ao templo já no oitavo dia para circuncisão, e
na idade de 12 anos já deviam ser consideradas adultas, no que diz respeito ao
culto; as crianças eram os futuros servos do rei. Deixem-me lembrar também que
as crianças deviam participar da páscoa, e elas tinham inclusive o privilégio
de perguntar: "O que significa isso"? E os pais tinham que responder.
Isso certamente foi na época em que o culto estava centralizado na família, mas
o mesmo é verdadeiro quando o culto foi transferido e centralizado no templo.
Eu sou pai de oito filhos, e eu e minha esposa temos experimentado o que é
educar, em termos de culto, a essas crianças. Eu sei o que estou falando; nós
somos avós de vinte e nove meninos e meninas, então podemos falar a partir de
uma situação concreta. Estou pronto para falar sobre isso. Eu acredito em culto
familiar, em casa e na Igreja.
Concluindo,
no Antigo Testamento encontramos cinco períodos; e, permitam-me enfatizar que
foi uma época de sombras, símbolos, tipos, e de preparação para a vinda de
Cristo. Agora estamos no período do Novo Testamento; o Cristo que foi indicado
no Antigo Testamento, como o Servo Sofredor, agora é o Cristo entronizado, Ele
trouxe tudo o que estava representado nos sacrifícios. Não há mais necessidade
de derramamento de sangue, mais ainda se espera sacrifícios. Nós trazemos os
nossos sacrifícios em cânticos, louvores, e dádivas; mas o maior sacrifício que
podemos oferecer a Deus somos nós mesmos. Quando Deus chama os presbíteros, os
líderes, os ministros, chama para o culto, chama para representá-lo, como
aquele que está entronizado, como o cabeça da Igreja. Portanto, é uma questão
de obediência que nos reunamos como povo de Deus, é uma questão de honra devida
a Cristo. Quando ouvimos e obedecemos àqueles que são os líderes apontados por
Deus para o Seu serviço aqui na terra, não é uma questão de escolha, Deus não
nos deu escolha. Ele nos chama para o Seu culto através dos Seus representantes
divinamente ordenados. E nós, como líderes da Igreja, temos que lembrar da
nossa responsabilidade. Devemos cumprir e mostrar a vontade de Deus ao povo. À
medida que comparecemos perante o povo, representando a Cristo, Sua Palavra e
Seu perdão, devemos lembrar-lhes a vontade de Deus, e isso de forma digna e
majestosa para que represente, por sua vez, a dignidade, a majestade e as
maravilhas de Deus. No nosso culto hoje, devemos refletir acuradamente sobre o
que Deus fez no passado. Não devemos imitar as práticas do Antigo Testamento,
não precisamos fazer aquilo que os puritanos fizeram, ou aquilo que os católicos
fazem, mas eu estou perfeitamente convencido de que nós temos que obedecer a
esses princípios que consideramos acima. Eles não foram revogados.
Vou
terminar com uma passagem do Novo Testamento: 1 Timóteo 1: 15-17. "Fiel
é a palavra e digna de toda aceitação, que Cristo Jesus veio ao mundo para
salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal. Mas, por esta mesma razão me
foi concedida misericórdia, para que em mim, o principal, evidenciasse Jesus
Cristo a sua completa longanimidade e servisse eu de modelo a quantos hão de
crer nele para a vida eterna. Assim, ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus
único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém." Nos céus... .
Eu não posso adorar tão perfeitamente como eles o podem lá, mas posso saber em
que eles estão envolvidos. Em Apocalipse 4:11, somos informados de que, lá nos
céus, junto com o nosso Senhor e Salvador, aqueles que estão adorando ao Senhor
dizem: "Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra
e o poder, porque todas as cousas tu criaste, sim, por causa da tua vontade
vieram a existir e foram criadas."
* Gerard Van Groningen é doutor em Teologia pela Universidade de Melbourne, foi
professor de Teologia do Antigo Testamento no Reformed Theological College,
Victoria, Austrália; Dordt College; Reformed Theological Seminary; Covenant
Theological Seminary e Centro de Pós-Graduação Andrew Jumper.